28/02/2020

UM MONGE

Ilton Carlos Dellandréa





Ontem, quando te vi,
na Praça da Matriz,
com tua roupa branca,
teus cabelos brancos e reluzentes
puxados para trás,
teus dedos brancos
e sapatos enormes, pretos,
tive pena de ti.

Tua batina branca colada ao corpo branco
e magro,
larga demais e engomada:
não sei se eras anjo
ou alma penada.

Tive pena de ti,
pelos cinquenta anos que passaste
longe da vida profana.

Tristonho como um avô sem netos,
os olhos macios, os passos retos,
lentos e firmes,
não sei se eras mundano
ou sublime.

Ontem, quando te vi,
na Praça da Matriz,
branco em tudo, menos nos sapatos,
tive inveja de ti,
pelo meio século que passaste na serenidade
da tua vida sacerdotal.

Não sei se és santo,
ou anormal.

Nem se nos espera a mesma Eternidade. 



 (Porto Alegre, 02 de abril de 1982).
 (Taquara, 25 de novembro de 1987)

24/02/2020

EM ALGUM LUGAR DO NORTE DISTANTE E SELVAGEM








O que aconteceu com o riso,
Com as fogueiras que as moças acendiam às vésperas
das celebrações de verão?
Onde estão os vilarejos ucranianos
E os pomares de frutas das residências? 
Tudo desapareceu num fogo voraz
Mães devoram os filhos;
Loucos andam vendendo carne humana
Nos mercados.



Oleksa Veretenchenko,
“Somewhere in the Distant Wild North”, da série de poemas 1933,
publicada em Nova Ukraïna entre 1942 e 1943,
traduzida pelo Congresso Canadense-Ucraniano, Filial de Toronto.


Extraído do livro de Applebaum, Anne. 
A Fome Vermelha: A Guerra de Stalin na Ucrânia. 
Record. Edição do Kindle.