Ela saiu da sala, deixou o gravador ligado, e ao voltar percebeu que riam dela. Depois ouviu na gravação que o professor comentou que o gravador representava a inteligência artificial usada para o estudo, enquanto a dona saia da sala para ir à cantina comer alguma coisa e engordar.
Não achei tão ofensivo assim. Foi um comentário infeliz, talvez. Mas atualmente tudo é motivo para exigir reparação a esse título. A cartilha do Nilmário Miranda sobre o politicamente correto foi adotada oficiosamente. Li, até, que os deputados do PL vão entrar com uma ação de indenização por danos imorais, digo, morais, contra o deputado Roberto Jefferson, que os acusou de participar do esquema mensalão.
Aliás, Roberto Jefferson já foi gordo, lembram? Fez uma cirurgia de redução do estômago e emagreceu 60 quilos. Foi seu maior erro. Os gordos são geralmente confiáveis e até por injunção física não podem se dedicar a certas atividades facinorosas com a mesma desenvoltura de um magro.
Nunca julguei um ladrão gordo que tivesse praticado um furto mediante escalada – por exemplo – e os batedores de carteira geralmente também são magros: precisam de preparo físico para correr caso sejam flagrados.
Aliás, condenei um gordinho, certa vez. Ele tentou arrancar a bolsa de uma mulher, que reagiu com a eficiência de toda mulher, isto é, aos gritos, assustando-o. Ele correu e ao atravessar a rua foi pego por um veículo que por acaso era de um Delegado da Polícia Federal... Além de gordo, azarado. O dano maior foi no capô do carro.
Eu sempre fui gordo, desde a infância, e além de gordo, ruivo e sardento. Em resumo, feio! Essas características motivavam gozações de colegas, algumas humilhantes. Se fosse cobrar pelos constrangimentos sofridos estaria riquíssimo.
Certa ocasião voltava da aula, assobiando, e na minha frente iam dois empregados da oficina mecânica de meu pai. Ouvi um dizer alto, após me ver:
– Hoje vai chover. Tem bugio assobiando. E quando bugio assobia na serra é sinal de chuva. Se o bugio é gordo, é trovoada na certa!
Para quem não sabe, bugio é um símio de pêlo avermelhado e aquela observação doeu fundo.
Noutra, ainda, eu tinha vestido calção para jogar futebol e o tio de um colega observou:
– Puta que o pariu! Olha só as pernas desse animal!
Eu era gordo do tipo pícnico e minhas pernas eram muito grossas. Envergonhado, corri para casa e nunca mais usei calção. Desisti do futebol, eu que tinha planos de me profissionalizar. Poderia ter jogado tranqüilamente até à Copa de 1982 e não deixaria o Paulo Rossi fazer o que fez com nossa seleção. O Brasil perdeu um grande jogador. Bem feito!
A obesidade é um problema mais de ordem psicológica do que física na infância e na adolescência. Na universidade eu havia superado esses traumas. Mas nem todos conseguem. Ontem, ainda, o presidente Lula, ao receber o Ronaldinho, usando da sensibilidade paquidérmica que lhe é peculiar, comentou que o atleta está mais gordo que ele... Mais tarde, pronunciando-se a respeito da corrupção galopante no governo, que eclodiu com as denúncias do ex-gordo Roberto Jefferson, disse que, se for preciso, na apuração das irregularidades, “cortará na própria carne”.
Não é preciso, presidente! Um bom programa de reeducação é suficiente para enxugar adiposidades maléficas. Estou falando de reeducação alimentar para emagrecer. Eu emagreci 21 quilos!
Publicado originalmente no blog Jus Sperniandi,
em 08/06/2005.
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