27/12/2008

PRECISO DE AUTO AJUDA

Estou pensando em escrever um livro de auto-ajuda. Não sei a quem destiná-lo: aos gordos ou aos deprimidos, principalmente aqueles que andam sempre buscando esta árvore de dourados pomos que chamamos felicidade e que são os seres mais infelizes do universo. Ou aos brasileiros em geral, que estão muito necessitados de um afago no seu ego e na sua cidadania.

Para os gordos tenho, além de prática e conhecimento de meio século, dois títulos apropriados. Como se sabe, a última escolha que se faz quando se escreve um livro é a do título. Por isto, se escrevê-lo, depois escolherei entre estes dois: “Só é Gordo quem quer Emagrecer” e “Só os Gordos bebem Refri Light”.

Eu sou gordo. Já nasci gordo. A frau Ierich (faz tanto tempo que não lembro se esta é a grafia correta), a parteira oficial de Taió, quando viu que eu não ia nascer numa boa chamou o médico, doutor Arthur que, indignado com minha teimosia, utilizou fórceps para me puxar para fora.

Acho que seria um bom início. Demonstrarei que o trauma violento que sofri por sair de um lugar aconchegante onde eu não precisava me alimentar sozinho criou em mim uma fome compulsiva diante da realidade do mundo que descobri poucos anos depois, cheio de nata de leite, lingüiça, doce de laranja, banha com açúcar, pão de aipim e ovo frito...

Quem não comeu pão de aipim quentinho com uma grossa camada de nata fresca e por cima açúcar cristal não comeu um dos manjares dos deuses. Quando não tinha nata, podia ser banha mesmo. Isto: banha de porco com açúcar. Não era bom quanto a nata, mas o colesterol agradecia, embora a gente nem soubesse que ele existia... E o pão de milho abatumado que a dona Almerinda, nossa vizinha, fazia...

Já li livros de auto-ajuda. Segui as instruções à risca. Parei ao entrar em depressão depois de tanto repetir, de mim mesmo para mim mesmo, com o dedo indicativo da mão direita encostado no nariz e o da mão esquerda no ouvido direito (para fazer circular a energia cósmica universal): “a cada dia que passa eu me sinto melhor, melhor e melhor!”. Além disto, arranjei uma labirintite.

Os para gordos nunca li, mas é como se tivesse lido porque continuo gordo. Sei que é possível alcançar resultados positivos com eles. Li um (cujo nome, infelizmente, foi retirado da minha combalida memória depois de ler “Como aprimorar sua Memória”), escrito por um anão que, com exercícios mentais elaboradíssimos e específicos, conseguiu se tornar um adulto fisicamente normal. Ele luta para crescer ainda mais e entrar no Guinness como o homem mais alto do mundo.

No meu caso, o problema é que sou muito preguiçoso. Não sei se existe algum de auto-ajuda específico, ou seja, que me motive o suficiente para escrever um livro.

Escrever, não. Terminar de escrever. Tenho três prontos, cinco semi-acabados e uns 19 que estão arquivadinhos no meu cérebro mas não saem. Mais este projeto agora, do livro de auto-ajuda. Talvez fosse bom escrever para os preguiçosos mentais como eu. Algo como “Exercícios de Auto-Ajuda para Você escrever um Livro”. É uma boa idéia.

Fiz uns cálculos. Com esses livros eu poderia obter reconhecimento internacional e até ser agraciado com o Nobel de Literatura. Teria que viver pelo menos 130 anos, mas nada que um livro de auto-ajuda tipo “Viva até os 150 anos” não pudesse resolver...

Vou deixar para começar amanhã. Ou depois.

Pensando melhor, o ideal seria um fórceps para desencalacrar esses livros do meu cérebro...

Publicado originalmente no blog Jus Sperniandi,
em
17/11/2005.
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