25/10/2021

APALPADELAS MÉDICAS


Sem preocupação com o politicamente correto: você se sente bem após uma consulta médica hoje? Falo de uma consulta normal com um médico normal. Enxoto, preventivamente, o exame de próstata, da questão.

Nestes tempos em que tudo é diagnosticado por sofisticados exames de raios de todas as espécies, ultrassonografias e ressonâncias magnéticas, essa não é definitivamente uma consulta normal. Para examinar suas coronárias enfiam um cateter que chega ao coração e, se preciso, imediatamente instalam “stents” para corrigir obstruções. Para examinar sua próstata enfiam prosaicamente o dedo naquilo que é torto mas chamam de reto para sentir se está macia ou encaroçada...

Volto à pergunta e respondo: não gosto das consultas, hoje em dia. O diagnóstico depende sempre de uma constelação de exames de todos os naipes, alguns demoram dias, e há médicos que requisitam outros, depois, para confirmação.

Há alguns anos, era diferente. Você relatava os sintomas, o doutor Pascoal, que foi médico em Taió, fazia as perguntas clássicas para tentar enquadrá-los, auscultava seu coração, seus pulmões, depois o deitava numa maca e apalpava minuciosamente seu abdômen. Espalmava a mão sobre seu estômago e fígado e tamborilava sobre ela com o dedo médio, procurando algum som estranho. Examinava seus ouvidos e garganta, mesmo que você tivesse ido lá apenas para tratar de uma unha encravada.

Hoje não. Você vai ao gastroenterologista com uma dorzinha na “boca do estômago”, espera uma apalpadela – uma piedosa apalpadela – para ele identificar o local exato da dor, mas é inútil.

O último que consultei nem tinha maca no consultório. Perguntei se deveria deitar na escrivaninha, apesar de ocupada com papéis, canetas e o micro. Ele disse que não precisava e me chamou de brincalhão. E eu estava falando sério...

Saí de lá com uma requisição para endoscopia e outra para ecografia abdominal alta... Senti-me reduzido a uma coisa infundada, sem registro nos dicionários.

O médico é a única pessoa que pode apalpar você sem receio de comprometimento emocional e isto vale para ambas as partes, em situação normal. Senão a consulta parece incompleta e você sai do consultório mais inseguro do que quando entrou.

Exceto, como ressalvei, no caso de consulta urológica. E falo de cadeira porque já passei dos 70. Dos 70 anos, não dos 70 exames. Se fosse dos 70 exames teria que começar a desconfiar de mim mesmo.  

 

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