17/08/2007

O Cavalo Branco de Napoleão


Ontem (23072004), na vinda para Santa Catarina, como não estava dirigindo aproveitei para tirar fotos das paisagens. Em razão do movimento do carro não ficaram nítidas nem consegui uma pelo menos razoável.

Como não gosto de um texto sem imagem, talvez influência das revistas em quadrinhos da infância, resolvi postar essa aí em cima. Porque no processo de escolha lembrei-me do teste psicológico que fiz para ingressar na magistratura.

A maioria pensa que para ser juiz é só prestar um concurso de conhecimentos jurídicos e pronto.

Não é bem assim.

No meu tempo as provas eram de Português – necessárias, não é Glauco? – de Conhecimentos Jurídicos e de sentenças cível e criminal. Depois a prova oral, que chegava quase a ser cruenta: abordava os principais ramos do Direito, em pontos sorteados pouco antes, e era prestada tête-à-tête com um desembargador... Finalmente os exames médicos. Para avaliar nossas condições mentais nos submeteram a teste psicológico e a entrevista psiquiátrica.

A psicóloga que me examinou, depois de uma conversa numa sala à meia-luz – se não me engano à luz de velas – e que até então vinha sendo amigável e atenciosa, mudou repentinamente de conduta: empertigou-se, cruzou as pernas e passou a me olhar com olhos maliciosos. Só então notei que ela era loira oxigenada, vestia um vestido justo, roxo, e com um corte que deixava entrever grande parte de sua coxa bonita e bronzeada.

O ambiente estava propício a outras coisas e cheguei a imaginar que ela fosse pedir que eu lhe pagasse um cuba-libre. Assustei-me um pouco, mas mantive a calma. Isto é necessário a um juiz. Ela pegou um envelope, retirou deles as folhas com as manchas de Rorhschach, e ia me mostrando as gravuras para que eu dissesse a primeira coisa que me surgisse na idéia.

O teste terminou e ela pediu que eu fechasse os olhos e imaginasse estar caminhando por algum lugar e que, de repente, surgisse à minha frente um muro alto acobertando-me a visão. Então descrever o que imaginava existir do outro lado.

Imaginei uma pastagem, um verde exuberante, com uma floresta não muita alta aos fundos. Na verdade, veio-me à mente uma imagem do Campo de Waterloo que eu vira pouco antes em uma revista. Lembrei-me também de Napoleão, mas não lhe disse isto porque ali ele foi vencido. Um quase juiz não pode ser derrotista.

Findo o teste, timidamente perguntei se ela poderia antecipar alguma coisa do resultado. Não.

Preocupado, comecei a matutar que, talvez, eu tivesse exteriorizado um instinto indelevelmente eqüino. Tanta pastagem poderia induzir a isto. Lembro-me que nos jogos de futebol, quando atuava na linha, me chamavam de “cavalo” porque eu acertava mais as canelas dos adversários do que a bola. Alguns me mandavam pastar.

Bem. E a foto aí em cima, o que tem a ver com isto?

Pois é. Associei-a ao muro que a psicóloga ergueu na minha frente encobrindo-me a visão.

Como não consegui uma foto melhor, resolvi colocar essa para que aqueles que a vêem criem sua própria imagem detrás, tentando imaginar como seria bonita a paisagem sem essa poluição visual de placas e outdoors que colocam em nossa frente para prejudicar a visão. A interpretação é livre.

Quanto às pastagens de Waterloo após o muro elaborei, mentalmente, algumas considerações empíricas. Cheguei a imaginar que, se eu acreditasse em reencarnação, pudesse ter sido Napoleão em uma vida anterior. Mas há tantos que já foram Napoleão que eu não poderia ser mais um. Não sou tão megalômano nem o espírito dele suportaria tantas subdivisões.

Só resta uma conclusão, não muito edificante, mas que não posso ignorar: talvez eu tenha sido, na verdade, o cavalo branco de Napoleão.

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