22/03/2009

QUASE FUI UM ESCRITOR DE VANGUARDA

A Lêda, num comentário ao post Use Camisinha, mas não Sempre, me deu um puxão de orelhas. Por favor, não confundam com a Ieda, minha querida esposa. Desta eu levo puxões de orelhas todos os dias.

Mas a Lêda perguntou porque todo gaúcho é machão. Não gostou de dois vocábulos – acho que foi isto – que usei no texto.

Quem lê o meu blog há mais tempo sabe que normalmente não uso palavras chulas, não porque tenha alguma coisa contra quem o faz, mas porque simplesmente não gosto de fazê-lo sempre que for possível substituí-las por outras, mais sociais. Mas no caso da piada, a substituição a tornaria artificial e pedante. Também sabe que não sou gaúcho, embora resida no Rio Grande do Sul desde 1982. Sou catarinense, de Taió!

Claro que a Lêda, em me visitando pela primeira vez, não poderia saber disto. Mas esclareci na resposta ao comentário, em que não fui lá muito delicado. Através de e-mails a gente – como ela diz – selou o compromisso da paz.

Mas, coincidentemente, a Veja de 1.º/03/2006, pág. 94 traz uma reportagem de Jerônimo Teixeira que declina os requisitos para um escritor ser bem sucedido no Brasil hoje. Não sei se ser bem sucedido é vender bem – como o Paulo Coelho, que não aprecio como escritor – ou fazer sucesso com a crítica dita especializada.

Em todos os casos, ai vão os requisitos que a Veja informa, embora em tom acerbamente crítico, como escrever um livro “transgressor”, isto é, para chocar os leitores e, por isto mesmo, ter seu lugar na mídia e vender: escrever com desleixo, ser nojento (flatulências, ejaculações, excreções – todos os fluidos e gases corporais merecem descrições detalhadas), falar de sexo selvagem (tudo deve ser descrito com abundantes palavrões), criar personagens malditos e ser narcisista.

Penso nisto. Tenho três livros prontinhos, dois quase e uma centena – até a última vez que falei nisto eram 19 – na cabeça, todos eles que farão grande sucesso (não sei se de crítica ou de público), sem contar no risco de, pela primeira vez, um brasileiro ganhar o Nobel de Literatura.

Mas como estou meio passado na idade precisaria viver mais uns 50 para ser reconhecido e então seria premiado no pleno vigor dos meus 104 anos. Acho que a Academia não correria o risco de premiar um autor moderno e já ultrapassado.

Mas o risco maior, mesmo, seria freqüentar a Academia Brasileira de Letras ao lado de escritores como... José Sarney, por exemplo. Sua obra maior, Marimbondos de Fogo, é mais importante pelo título do que pelo contexto. Guarda, o título, uma profecia ligada ao PT e à sua tomada de poder. Entenderam? Dão ferroadas, deixam o rabo preso e tomam umas e outras. Acho que ele deveria lançar uma edição só com a capa e as páginas em branco, pautadas, para ser distribuída entre alunos carentes.

Mas o que me desanima muito são os apelos (ou apelações) referidas pela reportagem de Veja, além da minha preguiça fundamental (já pensei em escrever um livro de auto-ajuda para quem tem preguiça de escrever livros, mas a preguiça não deixa). E não gosto de usar palavrões. Não gosto de descrever cenas de sexo ginecológico e com isto, adeus sucesso.

Viu, Lêda. No fundo não sou o que você pensa. Mas quando escrevi o texto do qual você não gostou eu fui um vanguardista, mesmo que não soubesse.



Publicado originalmente no blog Jus Sperniandi,
em 03/03/2006.
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