10/10/2009

MINHA VIDA DE PRESO, DIGO, DE APOSENTADO

Estou frustrado com a condição de aposentado. Minha cidadania foi atingida cruel e impiedosamente. Até um preso tem mais direitos do que eu. É só conferir os artigos 38 a 43 da Lei de Execuções Penais que tratam dos deveres e dos direitos do preso. Confiram, para ver se não estou falando a verdade. Os regulamentos dos presídios lhes dão ainda mais benefícios.

Agora eles estão exercendo um não previsto na lei: o de fazer greve, uma greve de fome porque, ao que parece, estão descontentes com o reforço na segurança penitenciária. Eles têm direito a três refeições por dia e outros benefícios que não tenho e se queixam da segurança.

Eu estou doido para que reforcem a segurança do meu bairro. Na madrugada de domingo larápios furtaram um segmento de fio-de-cobre que transmitia energia elétrica para minha casa e fiquei pendurado numa fase só e vândalos derrubaram uma placa de sinalização na esquina.

Mas se fizer greve de fome serei ridicularizado. Seria como a do senador Paulo Paim, há alguns anos, quando o salário-mínimo contrariou suas expectativas. Durou cerca de duas horas. E ainda mais ridícula que a do Garotinho, que no início do ano fez greve de fome para merecer melhor atenção da imprensa que, segundo ele, o tratava de forma injusta.

Não posso dizer que ele estava errado na causa. A imprensa às vezes é injusta, mas os donos de jornais e os jornalistas, numa greve de fome contra eles, torcem para que ela continue e se o grevista morrer terão assunto para abastecer seus veículos por um ou dois dias. Talvez três.

Quanto à greve dos presos fico ainda mais frustrado vendo que eles podem se alimentar de bolachas e açúcar sem ser acusados de furar a greve (
aqui). Eles foram flagrados nessa situação, inclusive o Marcola. É uma greve de fome branca – e o pão e o açúcar estão aí para reforçar a idéia.

Eu deveria tentar o mesmo. Comendo apenas o necessário para sobreviver, talvez emagrecesse. Mas então minha greve seria considerada uma simples dieta de emagrecimento e, por isto, improdutiva. Meu cardiologista ficaria satisfeito, principalmente agora que ele comprou uma balança nova, sofisticada, digital, que aguçou o meu espírito consumista.

(Sou assim: não fumo, mas vejo em bazares isqueiros tão bonitos, com design sofisticado e atraente, que tenho vontade de fumar só para me exibir com um deles. Também não me peso, mas a balança do meu médico é uma beleza. Vou comprar uma nem que seja para decorar a mesa de centro da sala de estar. Ela tem estilo e servirá de apoio para copos. Poderei controlar quantos quilos de bebida meus convidados ingerem).

Os aposentados vivem – digamos assim – em estado permanente de inércia compulsória, embora haja os que façam bicos aqui e ali por absoluta necessidade financeira. Mas cogitar de voltar a trabalhar como greve para melhorar vencimentos é um absoluto contra-senso.

Já uma greve de fome de aposentados seria tudo o que o Governo gostaria que ocorresse: a maioria é idosa e adoentada, não resistiria muito tempo e morreria, contribuindo para reduzir consideravelmente o déficit da Previdência Social.

Agora estão defendendo o direito de preso votar (
aqui), através de mais um remendo, digo, de mais uma emenda constitucional. Se aprovarem a medida, os aposentados estaremos em posição de definitiva genuflexão social. Porque, como os presos, não trabalhamos, vivemos trancados em casa (ao contrário deles, não temos segurança, nem simples nem reforçada), compramos nossa própria comida e nos é subtraído o direito de fazer greve (da branca ou da outra), entre outras diferenças e semelhanças, sempre favoráveis a eles.

Só falta nos proibirem de votar.


Publicado, originalmente, no blog
Jus Sperniandi,
em 14/11/2006.
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03/10/2009

MAIS UM CAPÍTULO DE MINHA BRIGA COM A BALANÇA

O hábito de comer mais frutas e vegetais e de fazer exercícios físicos pode aumentar a expectativa de vida de uma pessoa em até 12 anos, segundo um estudo feito pela Universidade de Cambridge (aqui).

Só? Estou decepcionado. Pensei que a observância dessas e de outras regras que todos os dias jogam – hoje não estou propenso à escatologia – na nossa cabeça, se não nos desse a vida quase eterna, pelo menos nos levasse a viver aproximadamente, na contagem moderna, o tempo que viveu Matusalém (a vida – ou não-vida – eterna já nos está naturalmente assegurada).

Claro. Não há hoje quem viva tanto quanto Matusalém viveu. Mas eu acreditava que isto se devia exatamente ao fato de a maioria das pessoas não observar bons hábitos alimentares. Ninguém é lúcido o suficiente para se alimentar somente de frutas e vegetais. É preciso uma adequada mistura de carboidratos e de suculências como, por exemplo, uma picanha mal passada.

A pesquisa abrangeu cerca de 22 mil pessoas, entre 45 e 79 anos. Quer dizer: mesmo os mais idosos estão na casa de 79 anos. Eu, embora fibrilado, espero chegar um pouco além do que já cheguei. Mas se seguir essas prescrições corro o risco de comemorar(?) 130 anos: não sou hipertenso, não fumo, não bebo, sou apenas semi-sedentário (estou autorizado por meu cardiologista a correr religiosamente 200 m sem barreiras por dia, em uma hora), meu colesterol está controlado – ou estava, conforme veremos. Apenas – sempre tem um apenas – sou o que o meu médico chama bondosamente de gordinho...

Há algum tempo publicaram uma pesquisa dizendo que o chocolate, em pequena quantidade, reduz o colesterol (
aqui). Mas nesta pesquisa ele – assim como o refrigerante – é impiedosamente fulminado.

O colesterol é um capítulo à parte na vida de todo gordinho. Já narrei meus dissabores com ele
aqui, em 20/12/2005 (no meio da página): sempre que conseguia baixá-lo adequadamente uma nova resolução da CUUMI (Confederação Ultra-Universal de Medicina Iatrogênica) os reduzia. Daí a minha constante dessintonia com os níveis de colesterol: a má vontade dos indicadores.

Agora mais uma: a Veja de 01/11/2206 traz uma reportagem (Bom de Coração, página 122) em que informa que para o LDL (o mau colesterol) hoje o limite aceitável é de 160 (miligramas por decilitro de sangue, e que até há pouco era de 200) para quem não apresenta outros fatores de risco.

Pior: uma equipe de pesquisadores da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, questiona a recomendação de que o ideal seja um LDL menor do que 70... Pior ainda: para atingir um patamar tão baixo, além da dieta balanceada e dos exercícios físicos, só mesmo recorrendo ao uso de remédios, sobretudo as estatinas.

Dieta balanceada, exercícios, peso adequado, vida regrada, não bastam: temos que ingerir remédio para ser saudáveis mesmo que não sejamos doentes.

Na minha situação a ingesta de mais um remédio seria mais maléfica que benéfica: não pelos seus efeitos, mas porque me alimento de remédios. A comida normal é apenas um complemento alimentar.

Analisei a composição das drogas que uso. Todas trazem nos excipientes (a base que segura as substâncias ativas) altas doses de amido (principalmente de milho), lactose e até glicose.

Como é que vou emagrecer ingerindo substâncias tão terrivelmente calóricas?


Publicado, originalmente, no blog Jus Sperniandi,
em 10/11/2006.

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