19/09/2009

HONNI SOIT QUI MAL Y PENSE!

Ainda bem que temos bem fiscalizados, aqui no Rio Grande do Sul, a Moral e os bons costumes. O que seria de nossa televisão, dos comerciais, das novelas, dos seriados não fosse essa atividade fiscalizadora? Pornografia pura.

Mas a Idade da Luz de Néon está aí para demonstrar que qualquer mínima possibilidade de atingir esses dois conceitos está fora de cogitação.

Na Comarca de Panambi a Promotora da Infância e da Juventude, Caroline Mottecy de Oliveira, obteve liminar da Justiça impedindo a venda da Baby Assadinha, fabricada pela Cotiplás, de Laranjal Paulista (SP), destinada a crianças de 3 a 5 anos de idade (fonte: ZH de 01/11/2006, pág. 50).

A Baby Assadinha – essa voluptuosa e sensual boneca aí em cima – apresenta manchas vermelhas na região genital e sensores (atenção revisão: é sensores mesmo e não censores): quando se molha as assaduras com água quente, ela chora; com água fria, ela ri. Atenção: não se trata de miniatura daquelas bonecas infláveis vendidas em lojas especializadas.

Mas a Promotora entende que a localização dos sensores atrai a atenção das crianças para a área genital que, por isto, se concentram nessa região, estimulando precocemente sua sexualidade, “mesmo sem elas saberem”...

Quer dizer: os órgãos genitais para uma criança de 3 a 5 anos devem ser considerados algo que elas carregam mais como um peso, algo sujo, um apêndice moralmente indesejável, do que como um órgão comum que, na sua idade, só serve para uma coisa: fazer xixi que, dependendo da idade e da higiene, vai provocar assaduras reais.

As mães que têm filhos pequenos, por isto, devem evitar de passar creme ou anti-sépticos nos órgãos genitais de seus bebês na frente de outras crianças. Isto poderia aguçar-lhes, mesmo sem que elas saibam, o senso erótico e produzir – imagino – alguma tara mais tarde.

Até acho que a boneca não é muito educativa. Banhar com água fria as assaduras de um bebê não é, realmente, um bom remédio. Tampouco com água quente. E esta poderia produzir ainda o indesejável efeito de provocar queimaduras em crianças. Mas daí a dizer que essa brincadeira tenha algum cunho erótico ou de erotização há uma distância muito longa.

A psicóloga Roberta Cavalheiro Haushahn, do Serviço Sentinela – que protege crianças e adolescentes vítimas de violências física, psicológica e sexual em Panambi –, entende diversamente:

– A criança pode pensar que se para uma boneca é interessante tocar na região genital, para ela ou o coleguinha também pode ser.

O “o” coleguinha aí é que me surpreende um pouco. Quer dizer que a boneca seria destinada também a meninos? Ou que meninas que brincassem com as bonecas tentariam, depois, fazer o mesmo com meninos? Ou tudo isto estaria açulando as crianças a “brincar de médico”, algo que a Psicologia já demonstrou ser inofensivo?

Acho que está sobrando imaginação e faltando bom senso nessas conclusões. A reportagem diz que “Ana Lucia Guimarães, 47 anos, mãe de uma menina de 10 anos, é contra a proibição. Ela acha que quanto mais as crianças conhecerem o próprio corpo, melhor”. Também acho.

E me veio a mente o lema da
Ordem da Jarreteira, criada em 1348 pelo Rei da Inglaterra, Eduardo III, após incidente quando ele dançava com a amante, a Condessa de Salisbury. Em dado momento caiu a liga (jarreteira) que lhe prendia as meias. O rei juntou-a e a devolveu à dona. Percebendo manifestações e risos maliciosos dos cortesãos reagiu com a frase: Honni soit qui mal y pense, ou: “maldito seja quem mal pensar”.

Publicado originalmente no blog Jus Sperniandi,
em 01/11/2006.
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11/09/2009

LIVRAI-NOS DE TODO O MAL!


(O papa da época era Bento XVI)


Santo Padre:

Esses dias Vossa Santidade falou em abolir o Limbo mas parece que desistiu. Espero que não definitivamente. Assim, crianças não batizadas e infiéis honestos que morreram sem batismo migrariam para o Céu. Acho até que há o dedo de São Pedro nessa desistência.

Sei que no céu não há computadores (se houvesse o trabalho de sua manutenção seria dantesco – o adjetivo é proposital – diante da invasão de hackers que estão no Inferno e de vírus diabólicos criados pelo Demônio que, como a Santa Igreja propaga, é mais espertinho do que gostaria que fosse).

Creio que o livro em que São Pedro anota nossas falhas para, quando chegarmos lá, apontar-nos o destino, é também virtual e de uma virtualidade celestial. Ele deve ter um cérebro tão divinamente privilegiado que não necessita de anotações para consultar na hora: sabe quem merece o que e é isto que me inquieta.

Mas acho que ele ficou "p" da vida com Vossa Santidade e reclamou diretamente com Deus, pois ele teria um trabalho super-dantesco para consultar seus alfarrábios mentais e registrar os egressos do Limbo e destinar cada um ao seu lugar no Céu.

Talvez Vossa Santidade devesse trabalhar em conjunto com ele para que fossem fornecidos dados exatos ou, vá lá, aproximados, dessa migração com detalhamento de raça, religião, idade, etc. Acho que isso é mais fácil do que encontrar a origem do dinheiro do dossiê dos meninos aloprados do PT.

Tenho dúvidas sobre sua competência em extinguir uma instituição como o Limbo. Por interessar aos do lado de lá, aos mortos, a competência, salvo melhor juízo, seria exclusiva do Santo Pai. Mas me é vedado, por sua infalibilidade, discutir a respeito. O pior é que gosto de atacar dogmas de vez em quando, como, por exemplo, o da inexpugnabilidade da urna eletrônica que contém um limbo pelo qual transitam votos antes de ser divulgados e em cujo interior podem ser dar trocas e desvios. Mas esta é outra história.

Espero que leve a ideia adiante. Sempre tive pena das crianças pobrezinhas do interior de Taió que morreram sem batismo. Vossa Santidade as redimiria de culpas que elas não têm, coitadinhas. Não posso entender recém-nascidos condenados pelo pecado do primeiro casal, há milhões de anos, que comeu o fruto proibido cooptado pela Serpente (como se percebe, é antigo o hábito de trair conceitos superiores e transferir responsabilidades).


Fui batizado e, como católico, estou sujeito à ira divina. Não estou seguro de minha destinação. O não-cristão iria para o Céu, e não mais para o Limbo, por ignorância da nossa doutrina mesmo fazendo o que consideramos errado e ele tem fé de que é certo; o cristão precisa batalhar um bocado para merecer o Paraíso. E, pelo que sei, a condenação ao Inferno não contempla a possibilidade de regime semi-aberto ou aberto. Os políticos e juristas brasileiros que estão por lá – não devem ser poucos – ainda não convenceram o Capeta a instituir a progressão de regime.


Entendo um pouco de Justiça e tenho certeza de que Vossa Santidade estaria sendo absolutamente justo se abolisse o Limbo. Acho até que deveria ser mais ousado e implementar a idéia. Tomo a liberdade, com a devida vênia, de lhe fazer uma sugestão que recolocaria cristãos e pagãos em pé de igualdade e, para não pecar contra Deus, confesso que também advogo em causa própria. Vossa Santidade passaria para a História como o papa que mais bem fez pela humanidade, permitindo-nos entender definitivamente que Cristo desceu à Terra para nos redimir (=libertar) de todos os pecados


Permito-me, por tudo isto, humildemente sugerir que Vossa Santidade, atento ao dogma de sua infalibilidade (“tudo o que desligares na Terra será desligado no Céu”), quando da retomada do processo de extinção do Limbo, aproveite e, de uma vez por todas, desligue o Inferno também.




Publicada originalmente no blog Jus Sperniandi,
em 23/10/2006.

O papa da época era Bento XVI.
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05/09/2009

MAIS CONFUSÕES ALIMENTARES

Estive confabulando com o meu coração e ele está desconsolado. Chora aos soluços descompassados pois, como todos sabem, é fibrilado. Ele anda triste e confuso. Muito confuso. Não é sem razão que ele é completamente arrítmico.

Primeiro foi a crise da gordura saturada. Ele, que desde a infância estava acostumado a comidas gordurosas como nata, lingüiça frita na banha de porco ou no “azeite doce”, morcília (da branca e “da outra”) e principalmente ovos, teve que deixar de lado tudo isto e passar a ingerir algo como margarina – que no início era intragável – e alimentos leves, evitar lingüiça e principalmente a banha de porco, o azeite e as próprias frituras.

Surgiram óleos de soja, gordura vegetal, inicialmente saudados como a solução para a aterosclerose. Mas também se revelaram prejudiciais. Então o azeite Mazolla, de milho, sem colesterol, cuja marca transformou-se na própria substância. A gente, no mercado da esquina, pedia um Mazolla e já se sabia o que era. Recentemente surgiram óleos sem colesterol e se descobriu que o azeite de oliva, ao contrário dos outros, faz bem ao coração fulminando o colesterol ruim e ativando o bom (não sei até quando essa verdade vai prevalecer, mas ainda está na moda).

No tempo em que a gordura animal era um veneno admoestei meu pai, cardíaco desde os 36 anos, safenado, e já nos seus 60 anos de idade. Estava diante de um rico prato de comida e eu:

− Mas pai! Comendo isto tudo?

− Ah! − respondeu. Uma vez por dia não faz mal.

Depois do almoço, conversando a respeito ele confidenciou um tanto triste que se fosse atrás de tudo o que os médicos lhe diziam já teria morrido de fraqueza. Não levou muito tempo e ele faleceu, mas pelo menos não de fraqueza.

Agora nova mudança no mundo alimentar. Depois de expulsar de nossa dieta as gorduras animais combate-se as chamadas trans, ou vegetais transformadas, que seriam ainda piores: além de provocar a famosa “barriga de cerveja” (algo completamente despropositado, pois se come pão todos os dias e se culpa a cerveja do fim de semana) estimula a produção do colesterol ruim.

Mas nosso atento Governo tomou uma providência séria: de agora em diante todos os alimentos com gordura trans trarão no rótulo a quantidade dessa gordura, como acontece com outros itens calóricos.

Isto é bom. Faz bem. Você sabe quanta gordura trans está ingerindo na margarina, no pão, nos biscoitos, na massa, por aí afora. De agora em diante vai saber.

Não tomo Nescau, de nenhum tipo, mas apenas de curioso acessei o site da Nestlé para ver a diferença do
Nescau Prontinho comum e do Nescau Prontinho Light. Não consegui distinguir qual é o menos pior. No light foram retiradas várias vitaminas.

Por isto meu coração e eu estamos confusos, apesar da boa intenção do Governo em nos esclarecer. Estou pensando em, de agora em diante, deixar os alimentos nas gôndolas, trazer o rótulo e me alimentar deles.

Só vou aguardar que o Governo mande informar o grau de nocividade da tinta usada na impressão.





Publicada originalmente no blog Jus Sperniandi
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em 22/08/2006.

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