29/08/2009

JUIZ MALUCO OU INSPIRADO?

Há uma bem engendrada campanha contra o Poder Judiciário. Uma intolerância cósmica. Ele já foi amordaçado por um conselho externo que não faz mais do que não poderia ser feito sem ele e com menos exuberância. Mas como no Brasil a exuberância é superlativa e abundante (vejam as dançarinas do tcham) ele vale como intenção de provar que a Justiça se faz dentro da Justiça, o que não é um afirmativa pela qual eu colocaria a mão no fogo da lareira ali na frente. 
A Xuxa diz que já viu duendes. Se não me engano, no jardim da casa dela, há duendes. Ninguém a considera louca e mantém ainda hoje a coroa – coroa é bem adequado, não acham? – de “rainha dos baixinhos”. Não consta que tenha prejudicado alguém, embora, no meu sentir, seja a expressão máxima da dissimulação que a Globo consegue nos empurrar goela abaixo. 
Outro, o Peninha, também conhecido como Eduardo Bueno, se travestiu de historiador e lançou livros de História do Brasil em que não disse nada mais do que aprendêramos no Primário. É tido como grande historiador. Ele também confessou que viu duendes e afirmou que numa encarnação anterior foi vento... Acho que sobrou um pouquinho no interior do crânio. Não sei se alguma escola adotou seus livros. É provável que não. Mas fizeram sucesso, tanto sucesso que até eu comprei os três volumes da Terra Brasilis. Não sei se ele continua repetindo o que já disse em outros. 
A Mônica Bonfiglio, num dos Programas do Jô, via anjos por todos os lados. Apontava: “ó, ali tem um; lá tem outro!” Como ando mal das vistas e a tela da minha televisão tem apenas 42 polegadas (brincadeira, tem 28 ou 29) e porque provavelmente estava sem óculos, não vi nenhum. O Jô Soares, pela cara que fez, também não. Houve uns sorrisinhos imprudentes na plateia, mas ela não foi desmentida é uma horoscopista de escol. Já o juiz, quando julga, é um ser absolutamente solitário (não estou falando de desembargador, que sempre conta com outros dois, geralmente vaidosos conservadores que se acham liberais, para atrapalhar).
O Juiz da notícia aqui contava com o auxílio de três duendes – Armand, Luis e Angel – para ver o futuro e julgar. Prever o futuro foi coisa que nunca consegui na minha vida de juiz. Aliás, nem o passado posso prever, digo, rever com acuidade porque muita coisa se perdeu nos refolhos do meu cérebro cansado. Foi afastado de suas funções. É ou não é uma conspiração cósmica contra o Judiciário? 
Mas confesso – sou aposentado e agora posso me dar ao luxo de dizer disparates com proverbialidade – também usava entidades para me ajudar a julgar. Mas não tive a criatividade de nominá-las. Todas podem ser consideradas, em sua essência e origem, tão abstratas quanto os duendes do juiz filipino. Ou tão concretas quanto... São a Lei, a Prova do Processo e, principalmente, a minha Consciência. Claro, às vezes pedia auxílio aos meus botões, ou aos meus zíperes, ou aos meus velcros – conforme o traje –, o que é muito mais grave e denota mais demência do que conversar com duendes e anjos. 
Se a realidade judicial filipina for tão feia como a daqui, é possível que eles tenham afastado seu melhor magistrado. Porque, para ser juiz hoje, no Brasil, tem-se que ser minimamente louco. Para sobreviver mentalmente são, só se valendo do auxílio de duendes. Ou de Lexotan, ou Prozac, ou Lítio, outra santíssima trindade auxiliadora.


Publicada originalmente no blog Jus Sperniandi, em 19/08/2006.
.

22/08/2009

MAIS UMA FRUSTRAÇÃO CONSUMISTA

Mais uma vez saí às compras e mais uma vez voltei de mãos abanando (pelo menos, desta vez, de pés calçados).

Já narrei aqui minha frustrada investida no mundo do consumo
em 01/10/2004, no post Saí às Compras e não Pude Torrar a Grana, quando saí disposto a gastar uma grana preta para incrementar meu sistema de áudio e vídeo e acabei comprando apenas um gravadorzinho de R$ 100,00, em três vezes no cartão.

Ontem minhas pretensões eram mais modestas. Como há tempos não venho praticando exercícios, encontrei – foi o que pensei – a esteira dos meus sonhos. Fabricada pela Life Fitness, é um equipamento de ponta para quem acha que andar na esteira é muito monótono.

Até não acho. Antes de minha fibrilação cronificar eu andava regularmente uma hora por dia. Nessas andanças sem sair de lugar visitei inúmeros locais do Brasil e do mundo e muito do que publiquei no início do blog surgiram nessas caminhadas de cabeça fria e sem forçar pensamentos.

Aliás, foi para isto que comprei o gravadorzinho. Eu andava e gravava as idéias que surgiam que depois eram transformadas em postes (não gosto do plural posts, como muitos usam, e sei que o meu esclarecido leitor não vai confundir postes com postes: o primeiro é plural de poste e o segundo de post, apenas para não deixar dúvidas).

Mas eu dizia que saí para comprar a esteira dos meus sonhos: a 95Te, uma esteira com monitor de LCD com ligação para TV a Cabo, conforme se pode vislumbrar da gravura muito mal escaneada acima extraída da coluna Cobiça (nome apropriado para o caso) de Carlos Sambrana, em IstoÉ Dinheiro de 05/07/2006.

Ela é tão moderna que nem consta do site da Life Fitness, embora eu não seja a pessoa mais indicada para pesquisas na Internet: geralmente não acho o que busco, a não ser numa segunda oportunidade quando procuro outra coisa.

Pensei até em fazer adaptações para tornar a minha caminhada ainda mais cômoda por causa da fibrilação: como os dois braços da esteira são bem compridos, ataria neles uma míni-rede para que pudesse sentar.

Para aumentar ainda mais minha comodidade pensei em comprar um par de skatênis, esses tênis novos, de rodinhas, para que eu não precisasse nem articular os joelhos: sentaria, após ligar o monitor, ligaria a esteira e pronto. Claro, é mais fácil sentar num sofá e ligar a tevê. Mas tenho sonhos homéricos de consumo e bem-estar e aprecio coisas modernas.

O preço é salgado mas, de novo, me baseio em filmes americanos e agora também na vida brasileira: os caras não trabalham e estão sempre cheios da nota. Fora os que não fazem nada, a não ser viajar, e ainda assim duplicam seu patrimônio em menos de quatro anos!

Mas a esteira tem um inconveniente grave. O monitor é fixo e eu, sentado, não veria a imagem com nitidez. A tela não pode ser visualizada com perfeição inclinada para trás. Até colocamos uma cadeira para fazer o teste. Inútil. Mais uma frustração consumista.

Conclusão: desisti da esteira, passei numa loja de calçados e comprei um par de tênis comuns por R$ 89,90, em três vezes sem juros no cartão, para não dizer que não fiz nada na tentativa de voltar a fazer exercícios físicos e melhorar minha fibrilação, digo, meu coração.



Publicado originalmente no blog Jus Sperniandi,
em 07/07/2006
.
.

15/08/2009

LIVRO DO PARREIRA? NEM DE BRINDE!

Fui, ontem, a uma livraria no Shopping em busca do livro “Incêndio”, de Jorg Friedrich.

Notei que estava acondicionado num pacote mais grosso, envolto em plástico, com uma faixa em diagonal: pague um, leve dois.

Gosto de promoções. Sempre procuro adquirir devedês dessa forma e já entrei pelo cano várias vezes. A última foi com um filme chamado “Lenda Urbana”, que consegue a façanha de ser bem pior do que “Pânico”.

O brinde estava embrulhado em papel opaco. Indaguei ao vendedor:

— O que é esse brinde?

— É um livro muito bom. A empresa comprou muitos e estamos dando de brinde.

— É mesmo? Que livro é?

Ele ficou meio cabisbaixo e respondeu:

— É o “Como formar equipes que vencem”, do Carlos Pereira.

Estranhei um pouco, pois já ouvira título e autor semelhantes.

— Posso abrir pra ver?

— Não, não. Se abrir perde a garantia.

— Que garantia? Livro não tem garantia. E se eu não tirar o invólucro, como é que vou ler?

— Não sei! As instruções que passaram é que não pode ser aberto na loja, só lá fora. E garantia vence no instante em que o senhor sair pela porta.

Fiquei intrigado, mas como se vê tanta coisa nesse Brasil (como alguém que não faz nada dobrar o patrimônio em menos de quatro anos) não estranhei muito. Como os brindes geralmente são pagos, quis declinar.

— Vem cá. Mas não quero brinde. Quero só o Incêndio. Quanto custa?

— Igual. É brinde mesmo. E não temos condições de vender apenas um porque o preço é o mesmo e não enganamos o consumidor. É um brinde, realmente, no verdadeiro sentido da palavra.

— Então vamos fazer assim: eu te dou o brinde de presente.

— O senhor tá louco? O que é que vou fazer com esta porcaria, quero dizer, eu não gosto de ler e nem tenho tempo para isto.

Rasguei o invólucro e verifiquei se tratar do “Formando Equipes Vencedoras”, do Carlos Alberto Parreira. O vendedor baixou a cabeça.

— Desculpe-me tentar enganar. Mas é brinde mesmo. O senhor leva de graça. Baixaram uma norma aqui: quem não conseguir empurrar esse livro de brinde com qualquer outro perde o direito à comissão. Me ajude, por favor.

— Tá. Eu levo. Mas vou jogar na primeira lixeira ali na saída.

— Ih! As lixeiras já estão cheias desse livro. É melhor o senhor levar pra casa. O senhor não tem lareira?

— Tenho.

— Pois é, com esse friozinho o senhor pode usar para começar o fogo. Não é uma boa idéia?

Fiquei condoído e trouxe o brinde para casa. À noite fui usá-lo para “prender” fogo na lareira, como diz o gaúcho. Depois que pegou comecei a pôr lenha por cima. Tinha queimado quase todo o vento lá fora deu uma rabanada jogando fumaça e cinzas para dentro, sujando o carpete...

Tive mais sorte que o senhor da ilustração aí em cima, que entupiu a rede de esgoto de sua casa. Gastou uma nota para desentupir!


Publicado originalmente no blogue Jus Sperniandi,
em 06/07/2006.
.

08/08/2009

SINTO-ME INJUSTIÇADO!

Sinto-me profundamente injustiçado. Eu poderia ter sido o centro-avante do Brasil nesta Copa do Mundo, no lugar do Ronaldão e, se não fosse melhor do que ele, certamente não seria pior.

Até minha massa muscular é superior à dele. Peso 97 quilos harmoniosamente distribuídos ao redor do abdômen. Só sete quilinhos a mais.

Minha fibrilação não seria empecilho. Para andar em campo eu não precisaria fazer muito esforço. É claro que teria que tomar cuidado com os dois ou três piques, como ele fez, mas isto também não seria problema. Bastaria tomar alguma cautela, cair em seguida, e com isto até ganharia tempo em favor do Brasil.

Para fazer o que Ronaldão fez não precisa muito preparo físico. O nutrólogo Carlos Werutsky, “um dos profissionais mais conceituados do ramo e coordena o setor de esportes nas associações brasileiras de obesidade e nutrologia”, disse à repórter Veridiana Sedeh (Veja, 21/06/2006, pág. 40):

Durante uma partida, os jogadores percorrem, em média, 6 quilômetros. Contra a Croácia ele não correu nem 1. Ele é o Ronaldão.

Percorrer um quilômetro em 90 minutos até um fibrilado pode.

Os treinos, como todos sabem, foram apenas brincadeiras de joão-bobo. Também seria capaz de enfrentá-los sem problemas, pois neles nem é preciso correr nem percorrer. Bancar o DJ, então, é mel na chupeta.

Vi o Parreira defender que ele foi escalado pelo que representa para o Brasil. Sugeri, então, que se convocasse o Pelé, que representa muito mais e, como eu, certamente teria feito mais que o Fenômeno.

O Pelé está em forma graças a complexos vitamínicos que tomou – segundo ele mesmo anuncia de vez em quando em comerciais – e que lhe permitiram chegar aos 65 anos com a vitalidade que tem. É certo que muitos desses complexos milagrosos só foram descobertos após ele ter encerrado a carreira, mas isto é apenas um detalhe que não interessa discutir aqui.

Eu sou mais novo do que o Pelé e já tomei vários complexos vitamínicos, o que pesa a meu favor.

Devo ser mais baixo que Ronaldão. Mas como ele não é especialista em cabecear – embora fizesse um gol de cabeça nesta copa – isto também não seria problema. Aliás, com 7 quilos a mais eu poderia trombar com mais eficiência com os zagueiros adversários e talvez até cavar algum pênalti.

Eu, de início, até quis dar um carteiraço na Comissão Técnica exigindo minha convocação. E, depois, minha escalação a cada jogo.

Só desisti porque tenho uma unha encravada e dói pra caramba com chuteiras Nike. É muito pior do que bolhas!


Publicada originalmente no blogue Jus Sperniandi,
em 02/07/2006.
.

01/08/2009

UM DIA A CADA DIA

Alberto Cohen


Hoje é o dia, o único hoje.
O ontem terminou sua missão
e o amanhã é sofisma até tornar-se hoje.
Sobrevivente da noite olha a vida
e abraça-te com ela.
É tua, inteira, como se agora nascesses
sem qualquer pecado original,
somente a esperança a te servir de pele
e os olhos deslumbrados pelo que há de vir.
Lá fora estão castelos e fadas
que podem ser reais,
risadas e soluços que ouvirás pela primeira vez
e o amor que te procura para também nascer.
És de hoje, nas entradas e bandeiras
em busca de sonhos possíveis,
ainda que improváveis.
És, enfim, o primeiro astronauta, no primeiro vôo,
a descobrir se a lua existe ou não.


.